ÉsTupi
do Brasil
Kithi
A obra de Clécio Penedo é tão atual quanto na década de 70, época de sua criação.
Fotos de Kithi - obras expostas no Museu Nacional de Belas Artes - Rio de Janeiro
11 de julho de 2020
"Para Clécio Penedo, a tarefa de pensar o Brasil, sua História, não está mais restrita aos cientistas políticos, professores, sociólogos ou antropólogos. Ela se estende também aos artistas, que com sua imaginação criadora, ajudam a ampliar nossa consciência de nação."
(Frederico Morais, fragmento do texto de 1995, "Buscando o Desenho Puro", para exposição de Clécio da série Chibata, no Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro)
No mês dos caboclos a Assum Preto foi lá no Rio de Janeiro buscar o pintor, gravador e desenhista mineiro Clécio Penedo. Tivemos a oportunidade de ver as suas obras expostas no Museu Nacional de Belas Artes, local onde o artista também foi estudante.
E tudo começou com o caboclo Urubatã, o mesmo que inspirou Pixiguinha a fazer o choro que leva o seu nome como título, uma das suas composições mais antigas, gravada pela primeira vez pela Orquestra Victor Brasileira em 1929 e reconhecida pelo musicólogo Mário de Andrade, que classificou a música como “admirável”, salientando a “riqueza e beleza de combinações instrumentais”.
Clique na vitrola, escute a música Urubatã e saiba mais da sua história no site do Instituto Moreira Salles
Era um domingo da década de 70 quando Clécio dormiu após o almoço e sonhou com ele falando assim: “pare tudo o que você está fazendo e vai defender o meu povo, eu me chamo Urubatã".
Clécio pulou da cadeira ainda meio sonolento e falou: “me dá um lápis, me dá um lápis”. A gente deu pra ele o lápis e ele fez o rosto do Urubatã. Daí ele ficou 18 anos produzindo essa série “És Tupi do Brasil”, assim fala Atonieta Penedo, viúva do artista, para a TV Brasil.
A sua arte é tão sutil e potente quanto o marketing desenvolvido para atrair os indígenas, que para o artista representa o povo brasileiro.
O consumismo passa a ditar as regras e os princípios para a vida humana, interferindo no comportamento natural da população. A obra "Índia Amamentando" da série "One Dollor" representa esse movimento de forma explícita. O leite da mãe vai sendo gradualmente substituído pela coca-cola.
Mas o artista, de tão lúcido, incluía a própria arte como sendo parte do sistema.
"Um mito é um mito. Seja uma garrafa de Coca-Cola ou Marilyn Monroe, D. Pedro I ou Mickey Mouse. Todos são produtos de consumo, inclusive a obra de arte que critica o comportamento da sociedade de consumo e toda a sua mitologia." (Clécio Penedo)
Uma das suas bases de análise e motivação criativa vinha dos fatos expostos nos veículos de comunicação. Até mesmo a identidade visual de alguns produtos, como a Revista Time, eram utilizados para compor as "sátiras imagéticas", uma crítica a americanização do Brasil.
Sére One Dollor
Clécio é um testemunho do seu tempo histórico. Sua obra, rica em detalhes, oferece ao público estímulos para a reflexão dos fatos ocorridos no país.
Consciente do processo de aculturação visível no Brasil do século passado que se estende aos dias atuais, Clécio misturava o seu desenho a recortes de jornais e de revistas, trazendo para sua obra elementos que representam a des-construção da cultura nacional.
Influenciado por Darcy Ribeiro ele observava a transfiguração dos povos e apontava com traços, linhas, humor e sagacidade a substituição de valores dentro da sociedade.
Sére Time
A ironia é verdadeira quando tem a sutileza de um gato,
a cor de um camaleão e a agressividade de um pernilongo. (Clécio Penedo)
A sutileza junto com a ironia e a força expressa nas suas criações traz a essência do Manifesto Antropofágico de Oswald de Andrade que propunha a "Devoração cultural das técnicas importadas para reelaborá-las com autonomia, convertendo-as em produto de exportação".
Na série "Comei-vos Uns aos Outros" Clécio faz interferências em obras de Picasso, de Miró, de Toulouse-Lautrec e outros artistas consagrados da pintura europeia, propondo uma horizontalidade de importância entre os povos.
Sére Comei-vos uns aos outros